Sem Pecado, Nem Perdão

12/07/2017 16:44

Em algumas oportunidades salientei as diferenças, no meu entendimento, entre Ética e Moral. A primeira é universal, aplicável em qualquer buraco desse planeta, a segunda, é particular, característica de cultura e tempo próprios, mutável. Não que a primeira seja monolítica, é mais rígida, objetiva.

Portanto, não vejo ambos os conceitos como sinônimos, todavia, muito diferentes. A primeira contém a segunda. Logo, para considerarmos um conceito moralmente válido, é mister que se constitua dentro da Ética. Daí resulta um problema especificamente brasileiro: em nome do “moralmente correto” cometem-se aberrações à luz da Ética.

Muito atacado em face do desconhecimento de sua rica e poderosa obra, o filósofo Nietzsche elidiu uma vigorosa crítica à moral e não à Ética. Quer dizer, ao se ater a criticar os valores pautados na dicotomia bem e mal, herança dos valores judaico-cristãos, sua obra não estava a propor uma “nova ética”, contudo, uma crítica à moral vigente e decadente.

O germânico afirmava que a maior preocupação do humano é tornar a vida possível, de forma pobre e mesquinha, sobreviver, muito parecido ao “conservar-se vivo de Hobbes”; para suportar a relação entre os “mais fortes e mais fracos”, criou-se a moral.

Vale ressalvar que: ao falar em mais fortes e mais fracos, ao contrário daquilo que é afirmado por muitos idiotas e néscios, não se trata de um apelo nazista, os adjetivos em questão referem-se a algo muito maior: a virtude.

Seu modelo de virtude é o grego clássico: o ideal do “guerreiro belo e bom”, aquele cuja força de caráter o move para realizar o que deseja, o que quer, e não aquilo que é “estabelecido”, “convencionado” em forma de uma “moral de rebanho”. Basta prestar a atenção nos “heróis” de Clint Eastwood. Fazem por querem. Por entenderem que deve ser feito. Sem esperar uma recompensa, um bônus moral, um título, um reconhecimento.

Viver “para além de bem e mal” significa fugir das imposições que nos amesquinham, nos apequenam e enfraquecem. Presos a elas, tornamo-nos “doentios e culpados”. Vivemos uma vida menor, em busca de uma pretensa “salvação da alma”, em troca da “destruição do corpo”. Se nos preocupamos apenas com o “além”, esquecemos o hoje, nossas vontades e desejos, nossos quereres. Nos escravizamos a padrões estabelecidos e impostos, presos a rótulos e “condutas alienadas e de rebanho”.

Todavia, não significa ignorar a Ética! Não se trata de um “salve-se quem puder”; “salvar a própria pele”. “Primeiro eu, dane-se os outros”. Não é a barbárie. É a “recivilização”, agora sob o viés da virtude. Para muito além do individualismo barato.

Postar-se nessa condição, acima de valores que nos empobrecem e aprisionam, transforma-nos em “Espíritos Livres”. Portanto, aptos à travessia para o “além do homem”, para o ‘Übermensch”.

Se fossemos capazes de cuidar de nossa vida, preocupados com ela, com nossos quereres e satisfações; se fizéssemos aquilo que entendêssemos que deveria ser feito, independente de imposições sociais; nosso conceito de vida melhor se transformaria em algo muito acima das meras satisfações mesquinhas e “egoicas”. Em outras palavras: se cada um se limitasse a cuidar de sua vida, sem se intrometer na alheia, de tal forma que, se não é possível auxiliar não atrapalhar já estaria de bom tamanho. Haveria de ser um “mundo melhor”.

Nietzsche apresenta uma moral maior, mais rica e viva, nobre, a fim de garantir o bem maior: a Ética.