Eu passarinho.

24/11/2017 10:33

 

Ligo o notebook e enquanto aguardo ele começar a funcionar, observo os dois pardais que estão na área. O magrinho pousa na borda da mesa em busca de umas migalhas de pão esquecidas e o gordinho (como sempre faz todos os dias) invade a vasilha de água dos cachorros para tomar banho.  Esse atrevimento dos passarinhos se tornou muito comum aqui em casa, principalmente quando os nossos cachorros ainda não estão por perto.

No quintal um bando de canários da terra está em busca de alimento, um beija flor pequenino também dá o ar da graça e da rua ouço uma sinfonia de piados diversos. Uma festa.

Esse privilégio, de acordar ao som e na companhia desses pequenos seres, também tinha quando morávamos na Vila Esperança, em São Paulo. As inúmeras árvores frutíferas dos quintais e das ruas daquele bairro atraiam várias espécies. Lá também recebíamos a visita de um beija flor, que toda tarde voava pela sacada do apartamento.

O som característico do computador me avisa que já posso abrir os meus programas: a correspondência do correio eletrônico, rede social e alguns sites de notícias. Resolvo adiar o périplo pela internet; a sensação de paz e alegria que as pequeninas aves me trazem é tão agradável – e necessária – que nesse momento navegar não é preciso. Viver, isso é o que preciso!

Imediatamente lembrei-me da beleza do Sermão da Montanha de Jesus –   que como disse Gandhi, a Grande Alma,  “se toda a literatura ocidental se perdesse e restasse apenas ele nada se teria perdido” – e  da poesia do Rubem Alves,  do Alberto Caeiro e dos Manoeis: o Bandeira e o de Barros. Como os pardais e o colibri, meus pensamentos voaram: livres, alegres, despretensiosos. E continuei ali no quintal de casa acompanhada de passarinhos, poesia e, claro, um bom café!

Extasiada com tanta simplicidade e leveza, deixei pra outro dia o texto que pretendia discorrer.

Observem as aves do céu: não semeiam nem colhem nem armazenam em celeiros; contudo, o Pai celestial as alimenta.

Nada vai atravancar o meu caminho, antes o voo da ave, que passa e não deixa rastro. A ave passa e esquece, e assim deve ser. Fui aparelhada para gostar de passarinhos, tenho abundância de ser feliz, por isso meu quintal é maior do que o mundo. O poema é o dedo do poeta apontando para o vôo do pássaro que está além das suas palavras. Passa, ave, passa, e ensina-me a passar, porque hoje, eu passarinho!