A verdadeira declaração da independência

06/07/2016 08:17

Sou apaixonado por futebol. Nunca escondi. Houve um tempo em que isso era considerado de péssimo gosto. Hoje é chique.

Intelectuais escancaram a paixão por suas agremiações do coração. Escrevem belos textos acerca do tema.

Considero-me um caso à parte: sou corintiano. Ser corintiano não é ser apenas e somente corintiano. Não se trata exclusivamente de torcer. É mais que isso: é devoção. A paixão insana, permitam-me a redundância, está acima de tudo. Nós corintianos amamos a instituição, independente de jogador, nome, marca, quem ou o que quer que seja.

Desde meus sete anos acompanho futebol e o Corinthians em particular. Sofri muito. Somente em treze de outubro de mil e novecentos e setenta e sete pude gritar “É Campeão!”. Quando vencemos a Ponte Preta de Campinas na inesquecível final do campeonato paulista de 1977. “Saímos da fila”, como se diz.

Todavia, reconheço, era pouco.

Somente em 1990 ganhamos um campeonato brasileiro.

Pequeno passo. Porém, continuávamos um time provinciano.

Nos anos noventa começamos a pensar em conquistas internacionais. No entanto, faltava estofo.

Ganhamos novamente o brasileiro em 98 e 99 no século XX. No século seguinte vencemos em 2005 e 2011. Conquistamos vários paulistas – somos os maiores vencedores do torneio –, a copa do Brasil em 1995, 2002 e 2009.

Fomos ao inferno em dezembro de 2007. Rebaixados, em 2008, passeamos na série B.

Grandes craques vestiram nosso “Manto Sagrado”. Todavia, nos faltava a internacionalização.

Depois de nova conquista nacional em 2011, Tite forjou uma equipe com a nossa cara. Um time técnico, mas, acima de tudo, brigador, organizado e consciente em campo.

Fomos para a disputa da “Libertadores da América”. Pesadelo para nós, na medida em que amargamos muito dissabores desde que nos dispusemos a conquistá-la.

Caminhamos de fase em fase. Invencíveis.

Chegamos à final, depois de eliminarmos Santos, vencendo na Vila Belmiro e Vasco da Gama, incluindo uma defesa inacreditável de Cássio e o gol de Paulinho no eclipse da partida.

Nosso adversário da decisão foi o Boca Juniors da Argentina. Várias vezes campeão do torneio. A primeira foi disputada em seu mítico estádio “La Bombonera”.

Os argentinos fizeram o primeiro gol, embora o Corinthians estivesse muito bem.
Pênalti em Liedson não marcado pelo árbitro.

Aproximando-se o final da peleja, Emerson Sheik “enfia” uma bola no meio da defesa argentina; Romarinho, que entrara a pouco, domina a bola e “cava” na saída do arqueiro. Silencio geral entre os portenhos. Festa na “Favela”!

Voltamos com um empate.

Próxima partida, Pacaembu; vitória simples bastava.

Uma semana de espera em meio à agonia do início da partida. Contudo, sentia-me confiante. Uma certeza inabalável me acometia, como em conquistas anteriores. Porém, essa era a maior. Tratava-se de nossa internacionalização. Nosso passaporte, como diziam os “bambi”.

Vencemos. Dois a zero. Dois gols de Emerson Sheik. Campeões da “Copa Libertadores da América”. Invictos. Nem o Santos do Pelé obteve tamanha façanha. Era 04/07 de 2012. Nossa independência. Nossa libertação. Internacionalizamos-nos. Que noite!

Definitivamente, comecei a compreender que ser corintiano não era necessariamente sofrer. O estigma de sofredor morreu; o mito do sofrimento foi dessacralizado. Convenci-me de que é possível – e melhor – vencer sem sofrer.

Para completar, em dezembro, no dia 16, ainda conquistamos o Mundial de Clubes, em Tóquio, derrotando o campeão europeu, Chelsea.

Sem fanatismo ou paixão, nossa conquista transformou o 04/07. Essa data é marcada hoje por esse acontecimento. Outro evento, ocorrido na mesma data, muito antes, tornou-se menor.

É nois, curintiá!