A Morte Dupla

18/10/2017 14:59

Domingo passado foi o “Dia do Professor”. Sintomático. Não houve nenhuma lembrança, ao menos, da data em questão na grande imprensa. Tão pouco no site da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Sequer a cartinha demagógica e mentirosa de anos anteriores.

O episódio denota, em minha opinião, a expressão escancarada do descaso, da omissão completa do poder público em relação àquele que deveria ser visto e tratado com a merecida seriedade.

É mais uma prova cabal da destruição paulatina e inconteste da instituição “O Professor”. É a morte.

Por falar em óbito, na segunda-feira, com muita tristeza, tomei conhecimento, por meio da Folha de São Paulo, do falecimento do professor Doutor Oswaldo Porchat. Professor Emérito da USP e da UNICAMP, foi um dos maiores nomes da Filosofia no Brasil, tanto no âmbito da reflexão, da produção intelectual e de seu ensino.

Criador do Centro de Lógica, Filosofia e História da Ciência na UNICAMP, redefiniu, ou melhor, definiu o conceito de “ceticismo”. Elucidou-o. Desvelou-o.

Por cético, comumente, entende-se alguém que dúvida de tudo; que descrê de antemão. Assim vê o senso comum.

Diferentemente, o professor Porchat entende que o cético é aquele que questiona “verdades”; desmistifica “os exageros e desmandos dos delírios da razão”. Portanto, não se trata apenas de pessimismo exacerbado e indiferença ao mundo. É muito mais. O cético é aquele que pensa, observa, pensa, observa; reflete e propõe. Suspeita. Quer dizer, é o papel do filósofo.

Me é muito viva a lembrança de palestra proferida pelo professor, durante encontro de professores de Filosofia, na antiga CEMP da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Nos idos de 1985. O tema: a Filosofia e o senso comum.

Recordo-me que dizia o professor Porchat: aquele que é tocado pela Filosofia, que a introjeta em seu cotidiano, jamais será comum. O simples fato de sentar-se à mesa de um bar, tomar um chope, deixa de ser algo comum. Seus pensamento e olhar sofisticam-se. Não tratará nada mais aos olhos comuns.

Por extensão, à excelência, o professor Porchat também desmistificou o próprio senso comum.

Era muito jovem e iniciava na profissão de professor. Formado há pouco tempo.

Jamais esqueci aquela lição.

Quando me volto, mais de trinta anos à frente, é deprimente, constatar que o senso comum permanece vitorioso. A mediocridade e a burrice imperam. O preconceito, o falso e apressado juízo sobrepõem-se à razão.

Falhamos.

Não aprendemos.

Não queremos aprender.

O preço é a morte.

Estou cético em relação ao futuro.